Silvio
Muniz, Do G1
Santos
Bárbara
Rabelo, filha de Iara Maria Matanzano, mulher assassinada por um jogador de
futebol em Guarujá, no litoral de São Paulo, na terça-feira (6), falou sobre as
circunstâncias que culmiraram com a morte da mãe. A jovem, que vive em
Uberlândia, Minas Gerais, disse que esteve com Iara no último domingo (4), após
ter passado cinco dias viajando com o marido, enquanto a mãe cuidava dos netos.
Inconformada, ela desabafou: “Eu queria ser advogada para mudar o mundo, mas
não consegui salvar nem a minha mãe". O suspeito do assassinato é Gianluca
Gerolano, de 21 anos, que atuava como lateral-esquerdo nas divisões de acesso
do futebol catarinense no começo do ano, mas havia sido dispensado
recentemente. Após matá-la, ele teria abaixado as calças da vítima e colocado
ketchup e óleo de cozinha nas nádegas dela.
A última
conversa entre mãe e filha foi na segunda-feira (5), quando Iara relatou o que
havia acontecido na última semana na vizinhança. “Na segunda-feira ela me ligou
e a gente conversou bastante tempo. Aí que ela veio me contar o que já vinha
acontecendo há duas semanas. Ela disse que tinha um casal no andar de cima que
vivia brigando, e que ela interfonou um dia desses e disse: ‘Moço, não faz
assim com a sua esposa, não é assim que você vai conseguir o amor dela'. Depois
disso, ele passou a perseguir ela, saía para trabalhar e ele estava na escada
com a vassoura na mão. Ele disse 'bom dia' e ela foi para o trabalho. Quando
foi à noite, o interfone tocou e era ele, dizendo 'ah, você me deixou de
coração partido’, e ela não quis dizer mais o que ele falou”, conta Bárbara.
Iara
ainda contou outros detalhes para a filha. “Quando foi no outro dia, pela
manhã, bateram na porta dela e ela desconfiou, porque o porteiro não avisou que
subiu ninguém. Ela abriu a janela que dava para ver a porta, e era ele, disse
que queria pegar uma vassoura emprestada. Ela falou que não tinha vassoura para
emprestar, porque a funcionária ia chegar e usar a vassoura. Ela disse ‘o
senhor me deixa em paz’, fechou a janela e foi trabalhar”, conta.
Barbara
conta que a mãe, dias antes de ter falado com Gianluca pelo interfone, tinha
percebido alguém andando pelo corredor, porque toda hora a luz do sensor
apagava e acendia. Iara então falou para um funcionário do prédio o que estava
acontecendo, e ele disse que a mulher do jogador ligou dias antes perguntando
pelo marido, dizendo que eles haviam brigado e ela estava preocupada com ele,
que saiu nervoso. Horas depois, a mulher voltou a procurar o funcionário,
dizendo que o marido havia aparecido. O que ficou deduzido é que ele ficou
essas três ou quatro horas sondando a minha mãe”, diz.
Bárbara
lembra que pediu para a mãe reforçar a tranca da porta e passar a andar com o
celular e o número da polícia sempre à mão, para que, caso ele tentasse
arrombar a porta, ela escutaria e chamaria socorro. “Só que ficamos sabendo que
ela chegou depois das 18h em casa, ele a pegou no corredor e entrou com ela no
apartamento. Ela tentou lutar, jogou uma almofada pela janela, para tentar
chamar a atenção de alguém, mas ele a esfaqueou três vezes. Ele ficou com ela
até 1h lá dentro e eu ligando desesperada”, descreve.
Durante
essas horas, Bárbara tentou ligar incessantemente para a mãe. “E ele com o
telefone dela. Chamava três, quatro vezes e desligava. Houve vezes em que tocou
até cair na caixa postal. Eu comecei a mandar mensagens, até que ele respondeu
se passando por ela. Dizia ‘estou bem, só estou cansada’, mas escrito tudo
errado e minha mãe escreve perfeitamente o português. Nisso, ficamos
desesperados, entramos em contato com o prédio, chamaram um amigo dela, eles
ligaram para a polícia e quando chegaram lá ela estava morta”, conta.
A polícia
prendeu Gianluca Girolano em casa, no apartamento que fica em cima do da
vítima. O suspeito já tinha atuado como lateral-esquerdo em um time que disputa
a 3ª Divisão de Santa
Catarina e estava passando os dias de folga na Baixada Santista, onde
nasceu. Após se contradizer durante o interrogatório, o jogador confessou ter
cometido o crime, segundo ele, movido pela cocaína.
A filha
da vítima estuda Direito, mas disse que pretende largar a faculdade. “Eu não
consigo entender como um ser humano tira a vida de uma mulher boa, que ligou um
dia pedindo para ele tratar a mulher dele com mais amor. Eu tenho que agradecer
à polícia que fez o trabalho rápido, e esse monstro está preso. E eu quero
dizer que desisto desse país. Eu faço Direito, mas desisto da faculdade hoje,
porque a polícia prende e a Justiça, daqui a seis, oito, dez anos vai soltar, e
ele vai voltar para a rua e minha mãe vai continuar morta”, desabafa.
Bárbara
fala ainda que pretende sair do país por causa da violência. “Eu vou embora
daqui. Vou sair desse país, porque tenho quatro filhos que adoravam a minha
mãe. Sou filha única, era só eu e ela, eles estão na minha casa agora chorando
a morte dela e eu vou ter que enterrar minha mãe. Eu desisto disso aqui.
Desisto do Brasil”, diz.
Iara morava sozinha e trabalhava como corretora de imóveis. Na última conversa
que mãe e filha tiveram, Iara disse que estava feliz, graças às vendas que vinha
fazendo. “Eu queria ser advogada para mudar o mundo, mas não consegui salvar
nem a minha mãe. Vocês da imprensa têm que mostrar isso, é o papel de vocês
mostrar para as pessoas que isso não pode ser assim. Nosso código penal é de
mil e novecentos e bolinha. Um homem que mata qualquer um vai embora para casa
responder em liberdade, que valor tem a vida nesse país? Nenhuma. A revolução
que a gente tem que fazer é essa, é por justiça. Eu não compreendo a palavra
justiça no Brasil”, conclui.