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sábado, 16 de março de 2013

ARTIGO

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O caminhão de lixo
(Valdir Dias)

Na agitação da vida moderna, muitas cenas urbanas se perdem, sem que haja tempo suficiente para retê-las na mente. É quando o cotidiano ganha contornos de novela que o ser humano comum, mais habituado a ser coadjuvante das histórias reais, pode se tornar protagonista, mesmo que isso ocorra meio sem querer.
Jorge parou de beber faz tempo, mas assim mesmo pensou em organizar uma festa de aniversário para si próprio. Convidou seus mais íntimos amigos e organizou o encontro no bar onde sempre encheu a cara, para provar a si mesmo que podia ver alguém beber e resistir à tentação etílica. A festa foi um sucesso e Jorge ganhou mais presentes do que antes ganhava quando criança. Juntou todos os mimos em sacos grandes de plástico. Colocou-os na calçada e foi pagar a conta.
Juca sempre mergulhava à tarde, bem no fim da tarde. Para ele, o mergulho soturno parecia mais interessante do que o clarão do dia, pois é quando os peixes guardam seus segredos mais sagrados e seus movimentos se transformam em imagens eternas. Juca retirou do automóvel os apetrechos de mergulho e os colocou em sacos grandes de plástico, deixados na calçada, antes de enfrentar o mar.
Jair pensa no amigo eremita, que vegeta na ilha deserta, como um ser que precisa de companhia e mantimentos. Para isso, reúne doações e compra rações para um náufrago eventual com o qual interage há anos. Dia desses, misturou os alimentos e roupas em sacos grandes de plástico, deixados na calçada enquanto o barco que lhe daria caronaainda ancorava.
O caminhão de lixo passou por ambas as calçadas e recolheu todos os sacos grandes de plástico, levando para a frieza de um aterro sanitário as roupas de mergulho de Juca, as doações de Jair e os presentes do Jorge. As histórias são reais e aconteceram em Guarujá, em diferentes datas. São fatos isolados, que nos fazem lembrar o quão fictícias são as intenções de quem os erros cometem, nos dias em que nem deveríamos ter saído da cama. Ou nem do saco.

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